“Cada
um (dos Espíritos) diz o que pensa e o que falam quase sempre é opinião
pessoal; eis por que não é para acreditar cegamente em tudo o que dizem os
Espíritos” – Kardec [2]
Já comentamos, em outras
oportunidades, sobre o cuidado que devemos ter ao realizarmos a leitura de
comunicações mediúnicas. Se com textos de autores encarnados, espíritas ou não,
o nosso senso crítico deve estar sempre ativo, com as comunicações do além este
cuidado deve ser redobrado. E não será a primeira vez que o texto do Espírito
Inácio Ferreira será analisado.
Seu primeiro texto analisado foi “A
Obra de André Luiz e a Física Quântica” onde ele se equivoca ao afirmar que
André Luiz teria antecipado as conquistas atuais da física, notadamente da
física quântica. O texto-resposta foi escrito em parceria com Alexandre Fontes
da Fonseca. No segundo texto, “Emmanuelismo”, Inácio assume a incumbência de
defender o Emmanuel de ataques que ele considera “pessoais”. Depois tenta
vender a ideia de que o Emmanuel, Espírito-guia do Chico, seria o mesmo que
possui uma mensagem publicada em O Evangelho segundo o Espiritismo. O texto foi
amplamente analisado e vale a leitura.
E muitos outros textos ainda
poderiam ser analisados. Entretanto, escolhemos este [1], por, mais uma vez,
comprovar o acerto de Kardec ao nos aconselhar a termos muita prudência com
toda e qualquer informação que venha quer do mundo espiritual. Eles falam o que
pensam e nós não precisamos assinar embaixo em tudo o que vem deles. Neste
texto, à semelhança daquele sobre Emmanuel ele pretende sair em defesa de Chico
Xavier denunciando os desmandos doutrinários cometidos – ele também chega a
afirmar serem desonestidades – contra o médium mineiro.
Primeiro o Inácio o defende contra
as opiniões de que ele teria errado “ao dizer isto, ao escrever aquilo,
tornando pública uma situação de lesa-Doutrina”, pelo fato de ter tido, o
Chico, uma vida irretocável em todos os aspectos. Creio não precisar afirmar
que este tipo de opinião é completamente ingênua, pelo simples fato de que uma
análise fria da biografia do Chico nos demonstrará os inúmeros momentos em que
ele errou e precisou retificar o seu erro.
Chico não foi um santo, foi um homem
e como homem estava sujeito a erros! Este é um ponto que não canso de
reafirmar, quando posso, devido às absurdas tentativas de santificação do
Chico. Já não bastassem as romarias ao cemitério onde o seu corpo foi sepultado
e ao museu que foi criado na casa onde ele viveu? Agora tudo o que ele escreveu
ou psicografou deve ser considerado intocável? Isso sim é impressionante, pois
nos leva a perguntar se somos espíritas mesmo. Posso afirmar sem medo que a
falta de um aprofundamento doutrinário durante boa parte de sua vida foi o que
permitiu que ele psicografasse e publicasse algumas [poucas] obras de conteúdo
duvidoso. Para bom entendedor o Inácio realmente exagera ao transformar um
pingo em uma letra distorcida. E o absurdo maior é insinuar que ele tem olhos e
que a “terra” do lado de lá irá comê-los (no mundo espiritual existe Terra? E a
questão dos inexistentes órgãos físicos no perispírito não já deveria estar
superada por não ter sustentação ante os informes dos Espíritos da Codificação
em todas as obras publicadas por Kardec? Além do mais, supõe o Espírito – ou
ele quer reformular o Espiritismo? – que o perispírito é perecível? Ver o item
254 e 257 de O Livro dos Espíritos [3]).
Cometendo tantos equívocos [que duvido serem
mesmo equívocos] como tentar sustentar que são os outros que querem induzir
algo nas pessoas? Não posso dizer que o Chico copiava, ou plagiava, pois,
conscientemente, não vejo motivos para isto. Aliás, discordo deste expediente.
Entretanto, não posso concordar com este espírito ao levantar novamente o
problema da suposta revelação andreluizina de mais de 40 anos atrás. Isso sim é
sutileza maquiavélica! Será que ele não exagerou mesmo? Vale muito a pena
verificar o que J. Herculano Pires tem a dizer sobre as obras de André Luiz e
seu lugar diante da revelação espírita:
“A obra de André Luiz é
ilustrativa da revelação espírita e não propriamente complementar, no sentido de superação que o
articulista propõe. É uma grande e bela contribuição nos estudos espíritas, mas sua pedra de toque é a codificação”
[4].
Depois, elenca três observações
contestáveis desde a primeira vez que foram publicadas. A primeira afirmação
temerária é a de que Chico teria sido a reencarnação de Kardec. Não sei o por que
desta insistência neste ponto, já que quando vamos realizar uma análise da
biografia de ambos, buscando suas semelhanças e, se assim podemos chamar, ‘projetos
reencarnatórios’, não encontramos pontos de contato, a não ser seu envolvimento
com o movimento espiritista. Para muitos o “argumento” mais forte seria a
previsão feita por Kardec e os Espíritos de que sua nova reencarnação se daria
provavelmente no início do século XX. Entretanto, bem sabemos que isto não
serve de confirmação pra nada. Sabe, para quem tem muitas dúvidas sobre este
assunto, aconselho a estudar os livros de Hermínio Miranda, contidos na série “Mecanismos
Secretos da História”, onde ele faz uma análise profunda, detalhada e criteriosa
com a finalidade de demonstrar que as semelhanças de destino e a identidade de
personalidade entre figuras como Hipácia, Giordano Bruno e Annie Besant, por
exemplo, são encarnações de um mesmo espírito. Mas, Miranda não faz
considerações apressadas, superficiais e nem baseadas em apenas uma “previsão”
como a contida em Obras Póstumas.
Quem tiver dúvidas, pode pesquisar dois livros em específico: Guerrilheiros da Intolerância e As Várias Vidas de Fénelon. Perceberão os leitores, a dificuldade que envolve tal trabalho, mas, acima de tudo, terão a oportunidade de compreender porque Chico não é a reencarnação de Kardec. E aceitarão que afirmações como estas do Espírito Inácio são irresponsáveis, por querer se fundamentar em certa vantagem que teria o Espírito só por estar morto e ter “acesso aos arquivos espirituais” que contariam a estória verdadeira. Observemos bem que ele pede apenas para crermos no que ele diz, sem provar que o que diz está certo fundamentado em uma pseudoautoridade que poderia ter só por estar morto e do outro lado da vida...
Quem tiver dúvidas, pode pesquisar dois livros em específico: Guerrilheiros da Intolerância e As Várias Vidas de Fénelon. Perceberão os leitores, a dificuldade que envolve tal trabalho, mas, acima de tudo, terão a oportunidade de compreender porque Chico não é a reencarnação de Kardec. E aceitarão que afirmações como estas do Espírito Inácio são irresponsáveis, por querer se fundamentar em certa vantagem que teria o Espírito só por estar morto e ter “acesso aos arquivos espirituais” que contariam a estória verdadeira. Observemos bem que ele pede apenas para crermos no que ele diz, sem provar que o que diz está certo fundamentado em uma pseudoautoridade que poderia ter só por estar morto e do outro lado da vida...
A sua segunda observação insere-se
no contexto da primeira no que podemos chamar de afirmação temerária e sem
fundamento. E lembrando a opinião de Herculano Pires, conquanto seja
interessantíssima e muito importante para os estudos espíritas, a obra de André
Luiz, não se configura como ensino universitário diante do Jardim da Infância
que seriam as obras de Swendenborg, Dale Owen [chamado por Ferreira de Vale] e
Stainton Moses, e, porque não, da própria Codificação. Pois é isto o que este
espírito quer dizer, insinuando-se desta forma. E o dirá claramente ao final do
seu texto. Mas, repetimos que a obra de André Luiz por mais importante que seja
só tem valor real quando tocada pela
pedra de toque da Codificação. E não o contrário. Até porque muitas
informações dadas por André Luiz não condizem com os princípios espíritas, se
não forem alvo de uma análise acurada. Exemplo: sabendo que não podemos
compreender as necessidades dos Espíritos baseando-nos nas nossas, pelo simples
fato de não terem os Espíritos órgãos físicos e sentidos sensoriais como os
nossos, como poderiam eles dormir e comer no mundo espiritual? Qualquer dúvida
é só olhar aqueles dois itens de O Livro dos Espíritos para início de conversa. Só isto evidencia que não podemos ser
levianos e apressados na leitura e divulgação de qualquer informação mediúnica.
A terceira observação se insere
neste movimento reflexivo que estamos fazendo. Para o Inácio, no fim, querem apenas
reduzir Chico a um mediunzinho qualquer. Eu discordo. Excetuando-se aqueles que
só conseguem denegrir, os demais, em sua imensa maioria, querem apenas que
Chico seja o que foi, nem mais, nem menos. Alguns médiuns, palestrantes,
adeptos do Espiritismo e Espíritos desencarnados é que querem pôr lenha na
fogueira e transformar o Chico em um santo!! Ignoram que Kardec nunca pôs um
médium sequer em evidência, pois, na opinião de Kardec
“Os nomes dos médiuns não acrescentariam, aliás, nenhum valor à obra dos Espíritos. Sua
citação seria apenas uma satisfação do amor-próprio, pelo qual os médiuns verdadeiramente sérios não se
interessam. Eles compreendem que, sendo puramente passivo seu papel, o
valor das comunicações não aumenta em
nada o seu mérito pessoal, e que seria pueril envaidecerem-se de um trabalho
intelectual a que prestam apenas o seu concurso mecânico” [5].
É exatamente isto o que fazem os médiuns hoje em dia?
Ocultam-se e deixam a obra dos Espíritos falarem por si mesmas? Ou
vangloriam-se eles e autografam livros que NÃO FORAM obra de sua inteligência
nem do seu esforço como se seus fossem? Quantos não buscam apenas isto: a
satisfação do seu amor-próprio e não a defesa da causa espírita? Seria isto que
Inácio queria fazer com o Chico ao não querer reduzi-lo a um mediunzinho
qualquer? E a opinião de Kardec neste ponto deve ser considerada ultrapassada
também?
Entretanto, a sua ousadia não para por aí. Valendo-se
apenas de sua “autoridade de espírito desencarnado e cheio de vícios” ele
afirma que “Não fosse a Obra Mediúnica de Chico Xavier, com toda a nossa
reverência a Kardec, a sua seria uma obra de mais de 150 anos atrás!” Ou seja,
Kardec está ultrapassado e as obras psicografadas por Chico são a sua
atualização excepcional... Será que preciso mesmo refutar opinião tão bem
fundamentada e criteriosa? Será que o Inácio simplesmente esqueceu que a obra
não é de Chico, mas dos Espíritos? E que qualquer erro contido nelas não pode
ser atribuído ao Chico e sim a eles, os Espíritos? Aqui vale citar a opinião de
Alexandre F. Fonseca sobre a obra psicografada por Chico de autoria dos
Espíritos:
“A obra mediúnica de Chico
Xavier, mesmo diante de todo o seu valor moral, literário e até científico, apenas possui o caráter da revelação divina
ou religiosa, pois o seu conteúdo não foi fruto da observação, investigação e
pesquisa de nenhum encarnado. Chico foi o intermediário dos bons Espíritos
para aprofundamento das verdades espirituais, todas elas de acordo com o
Espiritismo e embasadas no mesmo. Isoladamente,
as obras do Chico jamais constituiriam uma doutrina com o mesmo valor e caráter
que o Espiritismo possui, simplesmente por não satisfazer o caráter científico
de uma revelação” [6].
Por tudo o que já escrevemos nos artigos anteriores, só podemos
lamentar que opiniões equivocadas e maquiavélicas como estas estejam sendo
publicadas. Chamo de maquiavélicas porque não pecam pela ingenuidade, mas, pela
perversidade em querer impor uma opinião sem fundamentos nem argumentos lógicos
e coerentes, apenas uma suposta pseudoautoridade que teria este Espírito só por
ser Espírito... Dê ele os pinotes que quiser, essa é que é a pura verdade!
Por fim, respeitar a memória do Chico é também não
transformá-lo naquilo em que ele nunca cogitou. Seria uma honra ele ser a
reencarnação de Kardec, entretanto, ele não é. E isto não o diminui como ser
humano nem como médium. E não sou eu, apenas, que penso assim. Richard
Simonetti, J. Raul Teixeira e Dora Incontri, para citar três personalidades que
já analisaram e opinaram sobre o tema. Chico não precisa [e nem pode] ser
Kardec para que o respeitemos, admiremos e respeitemos. Nem Kardec dá pra ter
reencarnado como Chico, pois a única semelhança aceitável entre ambos seria a
participação no movimento espírita, e só. Querer mais é ignorar os princípios
espíritas e agir mais por idolatria [ao Chico] do que racionalmente [como
Kardec]. E mais uma vez, muito cuidado com o que lê na internet, caro leitor,
principalmente se foi psicografado [ou psicodigitado] por algum espírito.
Referências:
[1] O texto “É
Impressionante!!!” pode ser lido clicando neste link: http://inacioferreira-baccelli.zip.net/arch2012-08-01_2012-08-31.html,
em postagem do dia 20 de agosto.
[2] A citação de abertura do
texto pode ser lida aqui: PIRES, J. Herculano. Introdução ao Espiritismo. 1ª
Ed. SP – Ed. Paidéia, 2009, p. 145.
[3] A questão [e as dúvidas]
sobre a materialidade do perispírito e da existência de órgãos materiais nele
já deveria estar superada. Kardec foi explícito o suficiente sobre o tema e as
questões 254 e 257 de O Livro dos Espíritos não esgotam o tema. Vale uma
pesquisa por toda a codificação, especialmente nas Revistas Espíritas para uma
mais profunda compreensão do tema.
[4] RIZZINI, Jorge. J.
Herculano Pires – O Apóstolo de Kardec. 1ª Ed. SP – Ed. Paidéia, 2001, p. 245.
[5] KARDEC, Allan. O
Evangelho segundo o Espiritismo. 63ª Ed. SP, LAKE, 2007, p. 15.
[6] Ver esta citação em: http://analisesespiritas.blogspot.com.br/2011/05/obra-de-andre-luiz-e-fisica-quantica.html
·
Nota: Seguem os links com as
opiniões de Raul Teixeira e Dora Incontri sobre a questão do Chico não ser
Kardec para que o leitor possa ler na íntegra as suas opiniões.
O teu texto é muito esclarecedor. Parabéns pela coragem. Poucos espíritas leem com atenção tal tipo de mensagem, e destes, raros tem coragem para se contrapor. O texto está muito bem escrito, os argumentos estão bem colocados. Siga em frente, sem medo.
ResponderExcluirTexto muito bem escrito. Seria bom que todos os que se dizem espíritas pudessem ler. Claro, imparcial e respeitoso. Parabéns.
ResponderExcluirÉ no calor do controverso,com respeito á opinião do outro,é que se chega finalmente á verdade sobre determinado tema.Gostei do texto!
ResponderExcluirAnderson, gostei muito deste texto. Não sei se serve como esclarecimento, mas há um elemento da cultura espírita mineira no trabalho do citado médium. Aqui se valoriza muito os casos da sabedoria do Chico, mas durante anos faltou uma biografia mais completa dele. As histórias dele povoam nosso imaginário.
ResponderExcluirOutra questão é o papel de defensora da mediunidade de Chico Xavier contra os inúmeros ataques que ele sofreu, e que demarcou durante décadas a política da União Espírita Mineira. Mais que ninguém, o Chico mereceu ser defendido dos muitos interesses e ataques, mas como "o uso do cachimbo torna a boca torta" talvez os mineiros tenham ficado muito intransigentes em fazê-lo, fechando olhos para as limitações do médium, mais que o próprio médium, como você bem o disse.
Ivomar Costa, Marcelo Pereira e Ricardo, obrigado pela participação. Como Espíritas não podemos nos furtar às análises, não é? Eis-me aqui fazendo o que me cabe.
ResponderExcluirJáder, fico feliz que tenha gostado do texto. Sua informação serve como esclarecimento sim, pois da mesma forma que fazemos com o Chico fazemos com o Espiritismo, e, com isso, também perdemos em poder de argumentação. É bom ler a opinião de um mineiro sobre a cultura tão cara ao próprio Chico.
Entretanto, creio que o problema do Espírito e do médium são que ultrapassaram os limites da pura 'intransigência'. Principalmente o médium, por se permitir envolver por um Espírito que não prima pela verdade e sim por transformar sua opinião em verdade. Inquestionável.
Bom, obrigado a todos pela acolhida ao texto e sigamos em frente que em breve tem mais.
Muito bom nosso movimento precisa pois é carente logica e razão
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