segunda-feira, 26 de abril de 2010

Alerta contra a fascinação


Kardec informa, em O Livro dos Médiuns, que diante das diversas dificuldades que a prática do Espiritismo apresenta, precisamos colocar em primeiro plano o problema da obsessão. A palavra obsessão assume, assim, a função de termo genérico que designa o conjunto de características diversas resultantes do grau de constrangimento e da natureza dos efeitos que produz e que precisamos distinguir com precisão, cujas principais variedades são: a obsessão simples, a fascinação e a subjugação.


A obsessão simples é a forma de influenciação mais comum e de mais fácil diagnóstico e cura; a subjugação é o seu oposto, pois ela é um envolvimento que produz a paralisação da vontade da vítima, fazendo-a agir mesmo contra a sua vontade. Entretanto, neste estudo, nosso interesse maior é na problemática fascinação.


A fascinação define Allan Kardec, “trata-se de uma ilusão criada diretamente pelo Espírito no pensamento do médium e que paralisa de certa maneira a sua capacidade de julgar as comunicações. O médium fascinado não se considera enganado. O Espírito consegue inspirar-lhe uma confiança cega, impedindo-o de ver a mistificação e de compreender o que escreve, mesmo quando este salta aos olhos de todos” [1].


Os efeitos conseqüentes da fascinação são muito graves porque é graças a essa ilusão criada pelo espírito sobre o fascinado que pode levá-lo a aceitar as doutrinas ou teorias mais absurdas, como sendo a única expressão da verdade levando-o, ainda, a atitudes ridículas, comprometedoras e, até, muito perigosas.


É por isso que J. Herculano Pires afirma que “no meio espírita ela se manifesta de maneira ardilosa através de uma avalanche de livros comprometedores, tanto psicografados como sugeridos a escritores vaidosos, ou por meio de envolvimento de pregadores e dirigentes de instituições que se consideram devidamente assistidos para criticarem a Doutrina e reformularem os seus princípios” [2].


Assim sendo, é natural observar-se que na fascinação o espírito deve ser muito inteligente, ardiloso e profundamente hipócrita, pois, só assim conseguirá enganar e impor-se usando uma máscara e uma falsa aparência de virtude, usando as palavras caridade, humildade e amor como ‘carta de fiança’ para ser aceito.


O que desejam é impor a sua opinião e para isso procuram médiuns crédulos o suficiente para aceitá-los de olhos fechados. Eles são os mais perigosos pelo fato de não vacilarem em sofismar para melhor impor as mais ridículas utopias.


Normalmente utilizam uma linguagem empolada, mais superficial que profunda e cheia de termos técnicos, enfeitada com grandiosas palavras como Caridade e Moral, evitando inteligentemente os maus conselhos para que seus enganados possam dizer: observem que nada dizem que seja mau. Fica claro que os enganadores têm de misturar o joio e o trigo, pois de outra forma seriam repelidos.


Um fato interessante é que os espíritos desta classe (ver Escala Espírita [5]) são quase sempre escritores. É por isso que procuram médiuns flexíveis, que escrevam com facilidade, para poder transformá-los em dóceis instrumentos e, acima de tudo, verdadeiros entusiastas de suas ideias. Eles procuram compensar sua falta de qualidade pela quantidade de palavras, em escritos verdadeiramente volumosos, muitas vezes indigestos, num claro exemplo de prolixidade. Os espíritos verdadeiramente superiores são sóbrios nas palavras porque sabem dizer muita coisa usando poucas linhas e provando que devemos desconfiar sempre de toda fecundidade prodigiosa.


Aliás, sempre que se tratar da publicação destes tipos de escritos nunca será demais a prudência, pois as inúmeras utopias e excentricidades são um entrave enorme para todos aqueles que se iniciam no Espiritismo, dando-lhes uma ideia equivocada do que ele seja, desviando a atenção dos neófitos tanto dos princípios fundamentais espíritas quanto de suas inevitáveis conseqüências.


Pelo fato de que a obsessão propriamente dita só acontece quando o Espírito afasta voluntariamente todos aqueles que o poderiam ameaçar, impondo ao médium um isolamento que o impediria de ser alertado do engano a que se submete, é oportuno ressaltar que os bons Espíritos jamais se impõem, recomendando sempre que examinemos as comunicações, mediúnicas ou não, sob controle da razão e da lógica mais severa.


Outro fato digno de nota é que quando o Espírito vê que suas mensagens não são aceitas cegamente como queria, sendo submetidas à análise e discussão, além de não deixar o médium, redobrando suas forças para reter o fascinado, ainda pode sugeri-lo o pensamento de afastar-se do grupo, ou instituição espírita a que está ligado, quando não chega mesmo a impor como condição para o ‘sucesso’ do médium criar sua própria instituição, ou grupo de estudos, para dar prosseguimento aos seus ‘trabalhos’ e livros ‘reveladores’.


É por isso que todo médium, ou indivíduo, que, ao ouvir uma crítica a tais mensagens se irrita, aborrece ou embirra com as pessoas que não participam da sua admiração, que acha que suspeitar do seu obsessor é quase uma profanação não faz mais do que representar o desejo do fascinador, faltando somente que se ponham de joelhos ante as suas palavras para satisfazê-lo ainda mais.


Esse isolamento nunca é bom, pelo simples fato de que o médium fica sem possibilidades de controle sobre tudo o que recebe por sua psicografia. Pois quando o processo obsessivo é de origem ‘simples’ o médium está, geralmente, em condições de iniciar, ele mesmo o trabalho de ‘conversão’ do Espírito obsessor. Entretanto, na fascinação é o contrário, pois o Espírito pode adquirir um controle sobre a vítima sem limites. Reverter este quadro nem sempre é fácil, pois o fascinado se torna surdo a qualquer tipo de raciocínio, podendo chegar, até mesmo, a duvidar da Ciência quando o Espírito comete alguma heresia científica.


Deve o médium, se não quiser ser enganado, buscar esclarecer-se através da opinião de terceiros, bem como estudar todos os gêneros de comunicações, para poder aprender a compará-las. Pois se limitando somente ao que recebe, por mais sublimes que pareçam, fica exposto a enganar-se quanto ao seu valor, considerando-se que ele, o médium, não conhece tudo.


Não é à toa que, das nove características citadas por Kardec para se reconhecer uma obsessão [3], pelo menos quatro são facilmente observáveis em muitos médiuns, inclusive alguns famosos, nos dias de hoje:


1) Ilusão que, não obstante a inteligência do médium, o impede de reconhecer a falsidade e o ridículo das comunicações recebidas;

2) Crença na infalibilidade e na identidade absoluta dos Espíritos que se comunicam e que, sob nomes respeitáveis e venerados, dizem falsidades e absurdos;

3) Disposição para se afastar das pessoas que podem esclarecê-lo; e

4) Levar a mal a crítica das comunicações que recebe.


A obsessão é como já foi dito, um dos maiores escolhos da mediunidade, sendo um dos mais freqüentes, principalmente a fascinação, nunca sendo demais todas as providências tomadas para combatê-la.


É por isto que devemos ter sempre em mente este conselho de São Luís, quando nos encontrarmos em dúvida quanto à qualidade ou identidade de algum espírito: “por mais legítima confiança que vos inspirem os Espíritos [...], há uma recomendação que nunca seria demais repetir e que deveis ter sempre em mente ao vos entregardes aos estudos: a de pesar e analisar, submetendo ao mais rigoroso controle da razão todas as comunicações que receberdes; a de não negligenciar, desde que algo vos pareça suspeito, duvidoso ou obscuro, de pedir as explicações necessárias para formar a vossa opinião” (grifo nosso)[4].


Pois é, a experiência ensina, além disso, que não devemos tomar muito ao pé da letra certas expressões usadas pelos Espíritos, pelo simples fato de que se as interpretarmos segundo as nossas ideias nos expomos a enormes decepções e enganos. É por isso que precisamos analisar e aprofundar o sentido das suas palavras quando apresentam a menor ambigüidade. Só assim estaremos a salvo dos Espíritos pseudossábios e da problemática fascinação.


Referências:

[1] Kardec, Allan. O Livro dos Médiuns. Tradução da 2ª edição francesa por J. Herculano Pires. São Paulo – LAKE, 2004, cap. XXIII, item 239, p. 217.

[2] Idem, ibidem. Nota de rodapé.

[3] Idem, ibidem. Item 243, p. 219.

[4] Idem, ibidem. Item 266, p. 236.

[5] Idem. O Livro dos Espíritos. Tradução de José Herculano Pires, revista e anotada. 7ª Ed. São Paulo, LAKE, 2003. Livro segundo, capítulo I, item VI, q. 104.


* Artigo publicado na Revista Internacional de Espiritismo, edição de Junho de 2010.

quinta-feira, 8 de abril de 2010

Uma questão de responsabilidade mediúnica




“De maneira sistemática e contínua, vêm-se tornando comuns algumas pseudorrevelações alarmantes, substituindo as figuras mitológicas de Satanás, do Diabo, do Inferno, do Purgatório, por Dragões, Organizações Demoníacas, regiões punitivas atemorizantes, em detrimento do amor e da misericórdia de Deus que vigem em toda parte”. (Vianna de Carvalho [1])

Não é de hoje que o nosso movimento espírita se vê envolvido por pseudorrevelações de espíritos sistemáticos, presunçosos, escrevinhadores mesmo que, à conta de um palavrório técnico, com termos bem escolhidos e apoiados em palavras como Amor e Caridade, vêm se dedicando, de forma insistente, a tornar suas informações e opiniões pessoais em lei.

Contam ainda com a ajuda de médiuns imprevidentes, muitos verdadeiros desconhecedores, ao que parece, dos mais básicos conhecimentos sobre os escolhos resultantes da comunicação entre os dois mundos e, que, fascinados, sabe-se lá por que motivos se fazem intérpretes e porta-vozes destas mistificações grosseiras, que tanto mal fazem ao Espiritismo e ao movimento espírita brasileiro, e, porque não, mundial.

O Espírito Vianna de Carvalho, no trecho citado acima, faz referência direta a personagens que, de forma contínua, somos ‘forçados’ a ver publicados em livros, divulgados em artigos de seus simpatizantes e, que ironia, até presentes em eventos espíritas de grande porte, alguns tentando abordar [ou deformar] a Ciência Espírita. Que tristeza!

Ele ainda afirma que a Doutrina Espírita, “fundamentada em fatos, estudada pela razão e lógica, não admite em suas formulações esclarecedoras quaisquer tipos de superstições, que lhe tisnariam a limpidez dos conteúdos relevantes, muito menos ameaças que a imponham pelo temor, como é habitual em outros segmentos religiosos” [1].

Até porque “certamente existem personificações do Mal além das fronteiras físicas, que se comprazem em afligir as criaturas descuidadas, assim como lugares de purificação depois das fronteiras de cinza do corpo somático, todos, no entanto, transitórios, como ensaios para a aprendizagem do Bem e sua fixação nos painéis da mente e do comportamento” [1].

Vianna ainda esclarece no mesmo artigo que “da mesma forma como não se deve enganar os candidatos ao estudo espírita, a respeito das regiões celestes que os aguardam, desbordando em fantasias infantis, não é correto derrapar em ameaças em torno de fetiches, magias e soluções miraculosas para os problemas humanos” [...] [1].

Reflexões bastante oportunas não? Até porque “a simples mudança mental já proporciona ao indivíduo a conquista do equilíbrio perdido, facultando-lhe a adoção de comportamentos saudáveis que se encontram exarados em O Evangelho segundo o Espiritismo, de Allan Kardec, verdadeiro tratado de eficiente psicoterapia ao alcance de todos que se interessam pela conquista da saúde integral e da alegria de viver” [1].

É por isso que José Herculano Pires, eminente escritor, jornalista e professor espírita, em texto introdutório inserido em A Gênese, adverte que “não é através de pretensas revelações mediúnicas de Espíritos e médiuns invigilantes e vaidosos, nem de videntes convencidos de suposta investidura missionária, [...] que se fará o progresso do Espiritismo. Por isso, os espíritas dotados de humildade suficiente para reconhecer a sua incompetência espiritual e intelectual para tanto, servem melhor à doutrina e a preservam das deturpações dos invigilantes” [2].

Semelhante conselho é dado por Kardec quando adverte que nunca será demais a prudência, quando se tratar da publicação de semelhantes escritos, pois as utopias e excentricidades que são abundantes nestes, chocam o bom senso, provocando uma impressão muito desagradável nas pessoas que se iniciam, dando uma falsa ideia do Espiritismo e de suas conseqüências, sem contar que dá armas aos adversários do Espiritismo para ridicularizá-lo.

Há entre estas publicações as que, sem serem más e sem provirem de um processo obsessivo, podem ser consideradas como imprudentes, intempestivas e inábeis.

Em conseqüência disto Herculano Pires afirma que é “muito comum este fato, que vem ocorrendo com espantosa intensidade no Brasil, em virtude da propagação da prática espírita sem o desenvolvimento paralelo do conhecimento doutrinário. Por toda parte aparecem publicações inoportunas, desviando a atenção do público dos problemas fundamentais do Espiritismo, excitando a imaginação e o orgulho de médiuns incultos que, ainda em desenvolvimento, se deixam empolgar pela vaidade pessoal, dando atenção aos elogios de companheiros menos avisados e sendo envolvidos por espíritos pseudossábios, sistemáticos, imaginosos. Todo cuidado é pouco neste terreno” [3] (Grifo nosso).

Vale ressaltar que estes Espíritos evitam os maus conselhos por saberem que seriam ignorados, de maneira que os mistificados os defendem sempre, afirmando: “pode ver que eles não dizem nada de mau”. Mas a moral é apenas um acessório, que só serve para iludir e conseguir ser aceito, pois o que mais desejam é dominar e impor as suas ideias, por mais absurdas que pareçam.

Cabe observar ainda que desde a década de 50 temos inúmeros alertas de diversos escritores espíritas, encarnados e desencarnados, sobre este fato e parece-me que o espírita brasileiro, ao invés de aceitar a existência deste problema e se apressar em corrigi-lo, prefere acreditar em um falso protecionismo espiritual, onde eles nos protegeriam de tudo, até de ter o trabalho de analisar os textos vindos do além; sem contar que cabe a nós, e não a eles, os espíritos, conforme nos ensinam passar toda e qualquer informação dos espíritos pelo crivo da razão e da lógica mais severa, no exercício da vivência espírita do dia a dia.

Até porque, “jamais a mediunidade séria estará à serviço dos espíritos zombeteiros, levianos, críticos contumazes de tudo e de todos que não anuem com as suas informações vulgares, devendo tornar-se instrumento de conforto moral e de instrução grave, trabalhando a construção de homens e de mulheres sérios que se fascinem com o Espiritismo e tornem as suas existências úteis e enobrecidas”.

E o antídoto para essa onda de pseudorrevelações é o conhecimento real, lúcido e profundo do Espiritismo. Além da conscientização de que, para que uma informação seja aceita e deixe de ser considerada mera opinião pessoal e se torne hipótese, ou mesmo um princípio, ela necessita ser legitimada pela universalidade do ensino, através de um verdadeiro consenso entre as informações dos Espíritos, por médiuns desconhecidos entre si, de forma espontânea ou mesmo provocada, através das esquecidas e ignoradas evocações, em grupos sérios, solidamente formados, e por médiuns seriamente conscientes de seus papéis como intérpretes, e não autores, das informações dos Espíritos, conforme estabeleceu o Codificador.

“Desse modo [encerra Vianna], utilizando-se da caridade como guia, da oração como instrumento de iluminação e do conhecimento como recurso de libertação, os adeptos sinceros do Espiritismo não se devem deixar influenciar pelo moderno terrorismo de natureza mediúnica, encarregado de amedrontar, quando o objetivo máximo da Doutrina é libertar os seus adeptos, a fim de os tornar felizes”.

Oportunas as palavras deste Espírito, tendo em vista de que vêm acrescentar mais peso às vozes de meros espíritas encarnados, simples mortais que tentam exercitar a atitude crítica em nosso movimento, submetendo ao cadinho da razão e da lógica todas as observações sobre os Espíritos e as suas comunicações.

Encerramos com uma mensagem do Espírito Erasto: “lembrai-vos, ainda, de que, quando uma verdade deve ser revelada à Humanidade, ela é comunicada, por assim dizer, instantaneamente, a todos os grupos sérios que possuem médiuns sérios, e não a este ou àquele, com exclusão dos outros” [4].

Ótimas reflexões e bons estudos!

Bibliografia:
[1] Carvalho, Vianna de. Página psicografada pelo médium Divaldo Pereira Franco, no dia 7 de dezembro de 2009, durante o período de realização do XVII Congresso Espírita Nacional, em Calpe, Espanha e publicado em Reformador, edição de março de 2010, p. 9 -11, cujo título é Terrorismo de natureza mediúnica.
[2] Kardec, Allan. A Gênese, os milagres e as predições segundo o Espiritismo. Tradução de Victor Tollendal Pacheco; apresentação e notas de J. Herculano Pires. 21ª edição, São Paulo; LAKE, 2003, p. XIII.
[3] ______________. O Livro dos Médiuns. Tradução da 2ª edição francesa por J. Herculano Pires. São Paulo – LAKE, 2004, cap. XXIII, item 247, nota de rodapé, P. 222.
[4] ______________. O Evangelho segundo o Espiritismo. Tradução de J. Herculano Pires, 61ª edição. São Paulo – LAKE, 2006, cap. XXI, p. 265.

quinta-feira, 1 de abril de 2010

Salve Chico Xavier!



No dia  2 de abril de 2010, se estivesse encarnado entre nós, o saudoso Francisco Cândido Xavier estaria completando 100 anos de vida. Um vida totalmente dedicada à Doutrina dos Espíritos e ao consolo de milhares de pessoas.

Nascido em 2 de abril de 1910, a partir dos cinco anos de idade começou a ver e ouvir os espíritos, dialogando com eles, inclusive com sua mãe, já desencarnada, que vinha consola-lo pelos maus tratos que recebia de sua madrasta. Recebia ali as primeiras lições de disciplina, que mais tarde Emannuel, seu espírito protetor, tanto lhe cobraria, além de indulgência e humildade. Desencarnou em 30 de junho de 2002.



Sua primeira obra, até hoje uma das mais contundentes provas da imortalidade da alma e da realidade da comunicação dos Espíritos conosco é Parnaso de Além-Túmulo, uma coletânea com 173 poemas de 32 autores, entre brasileiros e portugueses e que ainda provoca pasmo e incredulidade em todos aqueles que, descrentes e desconhecedores da realidade imortal do ser humano, se mantém esquivos aos estudos e pesquisas que fundamentam a realidade insofismável do Espírito.

Após esta diversas outras obras seriam lançadas, muitas até hoje verdadeiras pérolas para nossa reflexão diária, enquanto que, algumas, muito poucas mesmo, como Brasil, coração do mundo e pátria do evangelho, de autoria de um pseudo Irmão X [Humberto de Campos, renomado escritor brasileiro], são inegavelmente obras confusas, obra de espíritos dogmáticos, mistificadores mesmo, e que só foram aceitas como verdadeiras porque vieram pela pena de Chico Xavier, do contrário teriam sofrido a análise e rejeição naturais a obras contraditórias, como tanto ensinaram os Espíritos Codificadores a Kardec.

Ora, não sendo Chico o autor das obras suspeitas, nada há que se preocupar pois os verdadeiros autores, os espíritos que usurparam o nome de Humberto de Campos, é que deveriam se sentir acuados por serem analisados ponto a ponto em suas palavras, se isso fosse feito à época. E se acontece hoje, lamentamos que muitos tentem desprezar tal avaliação qualitativa só porque consta o nome de Xavier como médium.

Até porque, da mesma forma, ele nada tem a se glorificar das boas obras que psicografa, senão por se esforçar em ter ao seu redor, por suas atitudes, mais espíritos bons que maus, e que, não sendo o autor intelectual destas obras, não lhe resta senão expor para apreciação sem que lhe seja cabível melindrar-se com qualquer crítica que seja feita a tais obras. Pois é exatamente isto que nos ensina o Espiritismo. Qualquer dúvida é só pesquisar em O Livro dos Médiuns e nos volumes da Revista Espírita, de 1858 a 1869.

Muitas destas obras, as boas e irrepreensíveis, são coletâneas de filhos, irmãos, pais e jovens que, desencarnados, vieram dar o seu testemunho de sobrevivência, enquanto outros vieram inocentar amigos, parentes, réus acusados de crimes aos quais não tiveram a culpa que lhes era imputada. Outras sãs as escritas por André Luiz e Emannuel, no que se refere às questões evangélicas e sobre a conduta do espírita. Outras contado um pouco sobre a época de Jesus, a autobiografia espiritual do próprio Emannuel em Há dois mil anos, que narra o seu contato com Jesus, a obra Paulo e Estevão, que conta a vida do Apóstolo cristão, e tantas outras de conteúdo moral irrepreensível. Embora ainda caiba a nota de que, referente às obras de André Luís e de seus informes sobre a vida no mundo espiritual, é preciso resguardar-se de aceitar como verdade última e insofismável, verdadeiro retrato da vida do lado de lá. Não. Não foi isso que Kardec ensinou.

Outros livros, um em especial, o Na Hora do Testemunho, em parceria com o também saudoso jornalista, escritor, filósofo e professor José Herculano Pires, é um grito de alerta contra a tentativa de deturpação do Espiritismo, realizada, à época, sob a tutela da FEESP, no lançamento de O Evangelho segundo o Espiritismo, em edição adulterada, na década de 70.

Outras duas obras em parceria com Herculano Pires foram lançadas e, ao lermos as diversas cartas do Chico publicadas em Na Hora do Testemunho, percebemos que o querido médium não foi coagido a participar de uma empreitada destas à força, muito menos que se sentisse ameaçado, mas, simplesmente decidiu manifestar sua opinião de forma contundente, e demonstrar que não era um ser passivo, manipulado por qualquer um que falasse mais energicamente.

Infelizmente, em toda a sua trajetória, salvo em alguns momentos, Chico era mais assessorado por bajuladores e tietes, que desejavam tê-lo como ledor da sorte ou oráculo, ou uma alavanca para a autopromoção, do que por verdadeiros espíritas que, à semelhança do que fizera Kardec com os médiuns diversos que conheceu e conviveu em sua sociedade espírita, dava amplo apoio e auxiliava no estudo e avaliação contínuas de sua própria faculdade mediúnica bem como dos ditados que psicografassem. Muitos, até, se pudessem, o elegeriam 'santo', apontariam 'milagres' obtidos por preces feitas a ele, entre outras atitudes incoerentes com tudo o que ele representa, ensinou e exemplificou.

Entretanto, polêmicas à parte, mesmo a que ainda hoje movimenta Minas Gerais, a da famosa senha que ele teria deixado para saberem se é ele ou não quem envia informes do outro lado, a sua pessoa, a sua bondade, a sua caridade, a sua certeza de que o Espiritismo deve e precisa ser conhecido de forma aprofundada para poder ser corretamente divulgado, o exemplo de seu mediunato, são as lições que devem marcar de forma indelével a cada um de nós.

Hoje, são mais de 400 obras em 70 anos de trabalho mediúnico. Vendeu mais de 25 milhões de livros e doou toda a renda (toda) para instituições de caridade. Nunca ficou com 1 centavo de tudo o que produziu.

É com alegria que escrevemos estas páginas, curtas, polêmicas, saudosistas, em reverência a uma das figuras espíritas brasileiras mais importantes, não simplesmente por sua mediunidade, da qual ele não fazia motivo de autopromoção, muito menos para se autodenominar 'o maior', mas, pela sua humildade, bondade, serenidade e capacidade de passar horas consolando e ensinando sem se sentir impaciente, incomodado, em um verdadeiro exercício de amor fraterno. E ainda, pela sua constante defesa pelo correto estudo da Codificação e pela valorização do conhecimento espírita, pelos espíritas e em benefício da sociedade.

Salve Chico Xavier, que teu exemplo sirva para todos aqueles que 'dizem' serem teus seguidores, admiradores, 'amigos' e simpatizantes da Doutrina que a conheceram em virtude de tua personalidade ímpar.