terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

A Importância dos Princípios

Quando um artista de talento se propõe a fazer um quadro magistral, a que consagra todo o seu gênio, dá, primeiramente, os traços gerais, de modo a compreender, pelo esboço, o resultado que espera obter. Só depois de ter minuciosamente elaborado o plano geral é que entra na execução das particularidades. E, posto que este trabalho precise ser executado com mais cuidado que o esboço, impossível seria, entretanto, executa-lo, se este não tivesse precedido. É o mesmo que se dá com o Espiritismo. (Allan Kardec, Obras Póstumas)
É importante refletir seriamente sobre o trecho acima transcrito. Pois nele se evidencia não só a importância dos princípios básicos no entendimento de qualquer assunto, mas, e acima de tudo, que exige muito cuidado a adição de todo e qualquer princípio àquilo que chamamos Espiritismo.E este é o objetivo deste texto.

Mas, antes de mais nada, façamos um esclarecimento: sendo a palavra norma sinônimo de princípio, vejamos qual seu significado:

§ Nor.ma. sf. 1. Aquilo que se adota como base ou medida para a realização ou avaliação de algo. 2. O que se tem como princípio, regra.

Assim sendo, sempre que usarmos os termos princípio, regra, ou até leis, será sempre, salvo exceção, com o sentido supracitado.

Como podemos perceber no texto de Kardec, embora todo o cuidado que os detalhes exigem para a confecção da obra, ela não existiria sem um esboço inicial, mesmo que só para ‘ordenar as idéias’.

E esta foi a importância do trabalho do professor Rivail e, consequentemente, um ponto capital para todos nós que desejamos auxiliar com nossos pequenos tijolos, no engrandecimento de tão majestoso edifício chamado Doutrina dos Espíritos.

Principalmente por que, conforme informa Kardec, em A Gênese, “a doutrina não foi ditada completa nem imposta à crença cega; [...] ela é deduzida do trabalho do homem, da observação dos fatos que os Espíritos lhes põem sob os olhos pelas instruções que a ele dão, instruções estas que o homem estuda, compara e das quais tira ele mesmo as suas conclusões e aplicações” . Importante observação não?

Enquanto que na primeira citação (no início do texto), ele enfatiza a importância dos princípios para a consecução da obra, no segundo ele aborda a inevitável responsabilidade que tem o homem de estudar, comparar e refletir para retirar, ele mesmo, suas conclusões com relação aos fatos ou ensinos dados pelos espíritos. Isto por que, no dizer dos Espíritos e de Kardec, [...] “tanto aqueles que o transmitem [o ensino] como os que o recebem não são serem seres passivos, dispensados do trabalho de observação e pesquisa; por não renunciarem ao seu próprio julgamento e livre-arbítrio; porque o exame não lhes é interdito, mas ao contrário recomendado” .

É fato capital este, por patentear a necessidade de passar tudo pelo escrutínio mais rigoroso, por uma análise profunda. Ainda mais hoje, quando observamos tantas obras ditas “espíritas” editadas e propagadas como revolucionárias, como contendo uma verdadeira renovação conceitual para o espírita e uma "atualização" para o Espiritismo.

E que quando analisadas mais a fundo revelam conceitos e princípios contraditórios, opostos às Leis ministradas pelos espíritos codificadores.

Entretanto, mudando de assunto, ou melhor, retornando para o motivo que me faz redigir estas linhas, voltemos para os princípios, e a importância de os termos compreendidos de forma clara e profunda em nossas mentes; pois, [...] "numa palavra, o que caracteriza a revelação espírita é que sua origem é divina, que a iniciativa pertence aos Espíritos e que a sua elaboração é o resultado do trabalho do homem".

Desta forma, para que o homem não desvirtue a ‘revelação’ forçoso se faz compreender profundamente as suas leis, bem como ser humilde e amante do bom-senso, à semelhança do Codificador, para que se possa julgar com isenção e sangue-frio.

E falando em Kardec, sobre este ponto, ele tem mais uma colocação adequada:

“As leis fundamentais, os princípios genéricos, cujas raízes existem no espírito de todo ser criado, foram elaborados desde a origem. As demais questões, quaisquer que sejam, dependem daquelas leis e daqueles princípios, daí a razão de ter sido, por algum tempo, desprezado ou negligenciado o estudo direto delas”.

Este trecho nos traz uma melhor compreensão sobre a importância do esboço na confecção da obra-prima pelo artista. Só que, aqui, as Leis fundamentais são as Leis Naturais que os Espíritos informaram em toda a codificação, principalmente, em O Livro dos Espíritos.

Elas foram elaboradas desde a origem pela Inteligência Suprema e causa primária de todas as coisas. Daí que tudo o que vier depois depende, forçosamente, destas.

E nisto cabe tudo o que se vê publicado atualmente, seja como espírita, seja como não-espírita. Pois, conforme asseveraram os espíritos:

"Não há, entretanto, para o homem de estudo, nenhum antigo sistema filosófico, nenhuma tradição, nenhuma religião a negligenciar, porque todos encerram os germes de grandes verdades...". [LE, questão 628]

Sendo este homem de estudo, espírita, não deverá agir da mesma forma? Cabe aqui mais uma citação, como exemplo de postura a ser observada e, por que não, imitada por todos nós:

“Apliquei a esta ciência o método experimental, não aceitando teorias preconcebidas, e observava atentamente, comparava e deduzia as conseqüências, dos efeitos procurava elevar-me às causas, pela dedução e encadeamento dos fatos, não admitindo por valiosa uma explicação, senão quando ela podia resolver todas as dificuldades da questão”.

Diante da enxurrada de ‘novidades’ que hoje encontramos dentro do Movimento Espírita, agimos da mesma forma com toda e qualquer teoria ou opinião? E quando esta vem assinada por um espírito, seja ele quem for, independente do nome que assine agimos à semelhança Kardec?

“Um dos primeiros resultados das minhas observações foi saber que, sendo os Espíritos as almas dos homens, não possuem a soberana sabedoria, nem a soberana ciência, e que o seu saber era limitado ao grau de adiantamento, assim como a sua opinião só tinha o valor de opinião pessoal. Esta verdade, reconhecida desde o princípio, preservou-me do perigo de acreditar na infalibilidade deles e livrou-me de formular teorias prematuras sobre os ditados de um ou de alguns”.

Creio que com todas estas informações e citações ficou clara a intenção deste texto: evidenciar a importância de se ter em mente, sempre, as normas básicas do Espiritismo, em todos os seus aspectos, para que, diante de qualquer informação nova, ou uma tentativa de reformulação de uma teoria antiga se observe sempre que as Leis Elementares, malgrado o que pensam alguns, são imutáveis, por serem nada mais que frutos da Mente Arquiteta do Universo. Princípios estes passíveis de análise e comprovação por qualquer um que se digne a estudar-lhes.

Pois em Espiritismo, seriedade, humildade, bom senso e desejo de aprender são pré-requisitos essenciais para seu correto estudo. Quiçá, para quando desejamos acrescentar algo a este majestoso edifício.

Esperamos que este texto tenha alcançado o seu objetivo deixando claro para você, meu caro leitor, a importância dos princípios básicos do Espiritismo para analisar toda e qualquer informação nova, ou velha, seja ela de fonte encarnada ou desencarnada, espírita ou não. Mas, e principalmente, que o conhecimento e compreensão destes princípios é imprescindível para todos aqueles que desejam transcender sua própria natureza, superar todo um passado de vícios e maus hábitos. Para todo aquele que aspira a ser, em um futuro próximo ou distante, um homem de bem.

E então, o que utilizamos como base ou medida para a realização ou avaliação de algo, seja em nossos estudos ou em nossas vidas? Que normas ou princípios regem nossas decisões?

Bons estudos e até a próxima!



Sugestão de leitura: toda a coleção da Revista Espírita; O Espírito e o Tempo de José Herculano Pires; Depois da Morte de Leon Denis; e, claro, a Codificação.

Bibliografia:


  • Mini Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, 2004, 6ª edição, Grupo Positivo.
  • Kardec, A. 2007, Obras Póstumas, 14ª edição. (Trad. João Teixeira de Paula, Rev. notícia sobre o livro e notas: José Herculano Pires). São Paulo: Lake -Livraria Allan Kardec Editora.
  • _____. 2003. A Gênese. 21ª edição. (Trad.Victor Tollendal Pacheco, apresentação e notas de J. Herculano Pires). São Paulo: Lake -Livraria Allan Kardec Editora.
  • _____. 2006. O Livro dos Espíritos. 65ª edição. (Trad. J. Herculano Pires). São Paulo: Lake -Livraria Allan Kardec Editora.
* Artigo publicado na Revista Internacional de Espiritismo, edição de Janeiro de 2010.